14 outubro 2008

Dia do Professor
O que você quer ser quando crescer?

Antes, não via o encargo de lecionar como a mais atrativa das atividades. Até mesmo porque, para muitos, o que atrai numa profissão é a condição financeira por ela gerada. Na infância e na adolescência, somos alfinetados pela terrível pergunta: 'O que você quer ser quando crescer?'
Certamente, nessa época, não temos a menor noção da grandeza desta escolha, mas mesmo assim são raros aqueles que, sem titubear, respondem: 'Quero ser professor!' E os poucos que optam pela resposta talvez ouçam dos pais: 'Meu filho, você pode ser coisa melhor!'


Não adianta sermos hipócritas. Nós professores, às vezes, nos pegamos desestimulados, sentimo-nos mal preparados, mal reconhecidos, mal remunerados. Já ouvi alguns amigos de profissão, excelentes mestres, dizendo que se tornaram professores por acidente, por falta de escolha. E o engraçado é que, mesmo com essa alegação, não consigo vê-los como farmacêuticos, psicólogos, engenheiros, talvez fossem um desastre fora da sala de aula.

É um lugar-comum falar das dificuldades de um professor. Por isso, é melhor tratar daquilo que a maioria sabe, mas não vislumbra.

O professor é um ser de outro mundo. Ele é a figura com a qual vamos passar grande parte da nossa vida. Desde que entramos na escola, é a figura do mestre que nos acompanha. A tia da alfabetização não ensinou só o bê-á-bá, começou a nos moldar para o convívio em sociedade, saber ouvir, respeitar, a ler e escrever. O professor é um terceiro pai que muda de fisionomia conforme crescemos, conforme a necessidade de adquirir novos valores e aprendizados nos coloca mais adiante. Algumas pessoas convivem mais com professores do que com os pais; também não é pra menos. Na pré-escola, no curso primário, no ensino fundamental, no médio e no superior, o educador está lá, reinando. É por isso que alguns são tão marcantes, nunca esquecemos os mais engraçados, o mais inteligente, o mais rígido e o mais amigo.

Não podemos esquecê-los porque eles estão embutidos em nós, assimilamos suas condutas, seus argumentos, sua maneira de olhar e falar. Fizemos uma salada de aprendizados e nos tornamos o que somos hoje.

A sociedade desvaloriza o papel do professor, porque ele próprio, em determinadas situações, menospreza sua inigualável função. Quem lida com o ensino não é apenas um profissional; é um mago, um artista, um poeta, um operário, um espelho da vida, é o alicerce de todas as outras profissões, já que todas elas passam pela figura dele. O trabalho de um mestre é construir a vida, esculpir a matéria, coletar verdades e colocá-las na prateleira, abrir caminhos, sarar as feridas, esboçar desenhos, salvar as pessoas.

Professor, além de tudo, é aquele que sabe olhar as coisas a partir de outro foco, sabe redimensionar as visões de sua retina e transformá-las em matéria viva. O que faz de um mestre uma criatura sobrenatural, um modelo de conduta, de comportamento e de inteligência é a sua maneira de lidar com a existência, de ser agente de mudanças, capaz de lapidar a sociedade e de criar no aluno o desejo de buscar respostas, de ampliar seus horizontes.

Entre todas as profissões, pode não ser a de maior prestígio, mas a mais lucrativa é, indiscutivelmente, a missão de valor mais belo. Se alguém me perguntasse hoje o que, na infância, eu queria ser quando crescesse, eu estufaria o peito e diria: 'Eu queria ser professor!'

Geovane Belo, publicado em O liberal em 14 de outubro de 2008.

10 outubro 2008


Cidade da Mãe de Nazaré

“Belém, Belém” o som da palavra lembra o badalar dos sinos, remete diretamente ao nome do

berço de Jesus. Certamente não nos parecemos com a Belém de Nazaré, somos outra, a histórica Belém do Grão-Pará, cidade das mangueiras, apogeu da economia da borracha. Todavia, não é à toa que este lugar, situado no coração da Amazônia, tenha se tornado a casa da Virgem de Nazaré.


O círio de Nossa Senhora, a maior procissão do mundo, não é só uma peregrinação religiosa pelas ruas da capital, é uma evocação à fé banalizada, ou esquecida por tantos. Numa época em que crer em Deus é uma atitude de poucos, ver uma cidade inteira se vestir de cores e cantos para uma tradição religiosa é reacender as expectativas de um mundo mais humano. Nas peças de cera, nas casinhas de isopor, nas pessoas presas à corda, vemos a humildade de um povo que se nutre de esperança e que necessita de pouco para ser feliz.


Apesar dos problemas vividos por uma metrópole - saúde precária, famílias amontoadas em palafitas, violência nas escolas - todos os olhares do país voltam-se para esta cidade. O percurso da berlinda ganha holofotes, exige-se a segurança de policiais, a organização de voluntários, o cuidado dos médicos, dos bombeiros, enquanto uma multidão reza, clama, chora, sofre e acredita, sim, acredita! O círio resgata o jeito simples de crer num amanhã melhor. Os devotos clamam por bênçãos e as histórias tão diferentes de cada um se confundem, no mesmo anseio, no mesmo canto:


“porque eu tenho esperança e muita fé / porque eu quero ter amor bem mais ainda / porque te amo, Senhora de Nazaré / quero puxar a corda de tua berlinda”


O segundo domingo do mês de outubro dos paraenses é um novo natal, as imagens da Senhora de Nazaré simbolizam aquela que disse sim, mesmo sendo pobre, aceitou a mais nobre das missões. O povo do Pará se identifica com a humildade da mãe, da serva do Senhor:

“Maria de Nazaré, Maria me cativou, fez mais forte a minha fé e por filho me adotou”.

Esse é o tempo de promessas de vida saudável, de melhores condições de moradia, de mostrarmos às montanhas de dificuldades que nossa fé pode movê-las. Milagres não são tolices, uma pessoa simples necessita de esperança, de prodígios e de sonhos. Precisamos urgentemente alimentar nossa alma de devoção, muitas vezes a racionalidade torna-se pretexto para a descrença.


Belém é a cidade que abriga a fé e a tradição. O círio de Nazaré revela a alma do povo paraense, (por vezes, esquecido) o nortista feliz, simples, acolhedor e afetuoso. As procissões movimentam o comércio, o turismo, mas, sobretudo, acionam o nosso coração. Vamos unir as famílias, não para uma festa de bebedeiras, mas para recuperar a união perdida. Vamos às ruas acompanhar as procissões, não para adorar uma imagem, mas para recuperar através da figura da Mãe a ligação com Deus.


Milagres acontecem todos os dias, aqueles que batalham para sobreviver sabem disso, a Virgem, nossa intercessora, nos dá apenas uma Santa forcinha.


Geovane Belo, Castanhal - PA, 11 de outubro de 2008.

Quem sou eu

Sou o que ninguém sabe e o que todo mundo conhece ou cobiça saber. Não me compreendem porque não me entendem. Não me entendem porque não me compreendem. É fácil. Se há certeza, é a duvida de tudo. Se há dúvida, é a certeza apavorante de não saber nada disso, nem daquilo, nem de coisa alguma. Não sou paradoxo, nada de versos sobre minha exatidão, sou imprecisão exata, abstração concreta, sou eu, só eu tão mim-mesmo. Se me queriam outro, por que procuram-me? Procurem outro, ou escavem esse outro em mim, tenho milhares de mins num eu. Ora, sou matéria palpável e dita de um absurdo impalpável e indizível. Só me entende quem não me quer entender. Não sou resposta, já disse, nem tenho respostas, sou a pergunta aberta e fria que nunca cansa de ser dúvida, que não cessa da convicção de não saber quem sou.
"A vida inteira estive em tudo como um deus, eu era todas as coisas de uma só vez, era a prece e a sentença, a entrega e a perdição, as juras e todo o pecado. A vida inteira cabia em mim porque eu era a vida inteira dentro de mim, até perceber que eu faltava a mim... perdi tudo sem nunca ter tido coisa nenhuma".