30 abril 2008

Gay é a mãe!

“Frutinha, bichona, veado, paca, boiola, gayzinho, biba, baitola...”.

A maioria dessas palavras soa como xingamento, um atentado à moral daqueles que se consideram, ou agem como homossexuais. Também não é pra menos, há uma mentalidade opressora em relação a uma prática sexual que, na verdade, trata-se de uma herança secular.

Primeiro, não há diferença entre homossexual e gay, todos sabemos. A palavra homossexual foi criada em 1869 pelo médico húngaro Karoly Maria Benkert, já o termo“gay” vem do Inglês e significa “alegre, jovial”. Contudo, atualmente é este último o estereótipo atribuído aos homossexuais; tal expressão não agrada em nada a classe, talvez porque há no vocábulo um tom de desdém, um julgamento negativo aparente.

O problema é visível. Veja bem, lésbicas, bissexuais, travestis, transformistas etc, são seres que, apesar do notável talento, simpatia, profissão, são vistos com menosprezo pela maioria, tornam-se figuras que ofendem os bons costumes, a moral, os valores da sociedade. Quer dizer, visão imposta por uma ética excludente, pela religiosidade tirana, pelo pensamento machista nunca extinto.

O homossexualismo é permitido em 128 dos 202 países do mundo. O Brasil não é tão liberal quanto a Holanda, que reconhece a união de casais do mesmo sexo. Apesar dos avanços de mentalidade, ainda existe uma generalização a respeito desta prática. A atualidade inventou um conceito de homossexual afeminado. Gay é sinônimo de frescura, de perversidade, de pecado... Acredita-se que o gay é uma ofensa, descaracteriza os aspectos básicos da natureza humana, por isso deve ser abolido, não serve como exemplo nem para os mais liberais. Pessoas costumam dizer que aceitam, mas não aprovam. Quem, por exemplo, sonha ter um filho gay? Aos olhos paternos seria um castigo de Deus. Até mesmo os bissexuais, pais de família, trabalhadores, machões do lar, não gostariam de ver seus filhinhos copulando com outro macho.

Recentemente uma campanha defendeu a idéia de que a orientação sexual não é uma escolha, o que causou muita polêmica. Um recém-nascido num berçário tinha uma pulseira de identificação e no lugar de seu nome, lia-se “homossexual”.

As pessoas em geral e até alguns homossexuais pensam que o gay é uma criatura anormal, um desvio de conduta, uma criação ao avesso, alguns destes demonstram que sua aspiração maior seria mudar de sexo. Culpada por isso é, principalmente, a tevê que tornou a figura do homossexual patética, humorística, devassa, absurda, uma espécie de “zorra total”. Coleciona-se, por influência, não só na tela, mas na vida “os Lobichomens, os Pit-bichas, os Seu-Peru, os vera–verão. A parada “gay”, iniciada em São Paulo, virou um evento comum em todo o Brasil. Em suma, fala-se muito em escolha sexual, mas ainda há preconceito sim e muito.

O que pouco se percebe é que um homossexual não precisa querer ser uma fêmea ambulante, não necessita de salto, rimel e batom, para assumir sua condição. O termo “gay” parece depreciativo porque carrega esse conceito risório de atitude feminina, de pessoa desmunhecada.

Podem-se enumerar os exemplos de homossexuais que eram muito machos. Em Atenas, a sociedade via como normal a relação entre um homem mais velho e um mais novo, este envolvimento tinha como finalidade a transmissão de conhecimento do erastes ao eromenos (amante ao amado). Há indícios históricos de que Aquiles amava Pátroclo e Alexandre se nutria de amores por hefaísto. Porém, estas paixões avassaladoras não mancharam a concepção de força e masculinidade dos guerreiros, ao contrário, imprimia-lhes ardor na proteção ao amado. Várias outras figuras da história também se inserem nesta lista: Julio César por Octaviano e Meco, Catlina; Cícero, Sócrates.

O homossexualismo não é uma herança apenas masculina. Safo, escritora grega que viveu na ilha de Lesbos, criava poesias de conteúdo erótico e foi censurada por monges copistas na idade média, porque era a mestre de uma escola só para moças, suas discípulas eram chamadas de amigas, e a mestre se apaixonava por todas as suas aprendizes. Considera-se advindas deste contexto as palavras “lésbica” e “safada”.

Aplausos merecidos ao filme “O segredo de Brokeback Mountain”, nele os personagens se apaixonam desordenadamente um pelo outro, nele o amor não é uma coisa imunda, devassa. O filme não fala de sacanagem, trata de um amor desenfreado, incompreensível e caótico. Como todo amor há de ser. É uma dose de realidade àqueles que acham impossível um homem se apaixonar desmedida e verdadeiramente por outro. Os personagens são um exemplo comum da vida cotidiana. É um filme para toda a família, sua maior lição é o amor, é um tapa na orelha dos puritanos simplesmente por comprovar que homossexualismo também é coisa de macho, e gay, no sentido depravado da expressão, é a senhora sua mãe.

05 abril 2008

riso

teu riso largo
deságua delírios
de lírios em mim.

teu riso lago
me leva, me vela
e me inunda de ti.

teus dentes açucarados
me lambuzam.
eu fico meio levado
rindo do teu riso
meio velado
meio de lado.

a tua boca me engravida.
minha vida é sorvida

teu riso sem siso
na gravidade
dessa idade
é ida e volta
me adultera e me devota.

teu riso alaga, alarga minha dor
teu riso largo é lago submerso
teu riso me esquarteja,
esmaga e corrói meus olhos.

teu riso me naufragou...

Quem sou eu

Sou o que ninguém sabe e o que todo mundo conhece ou cobiça saber. Não me compreendem porque não me entendem. Não me entendem porque não me compreendem. É fácil. Se há certeza, é a duvida de tudo. Se há dúvida, é a certeza apavorante de não saber nada disso, nem daquilo, nem de coisa alguma. Não sou paradoxo, nada de versos sobre minha exatidão, sou imprecisão exata, abstração concreta, sou eu, só eu tão mim-mesmo. Se me queriam outro, por que procuram-me? Procurem outro, ou escavem esse outro em mim, tenho milhares de mins num eu. Ora, sou matéria palpável e dita de um absurdo impalpável e indizível. Só me entende quem não me quer entender. Não sou resposta, já disse, nem tenho respostas, sou a pergunta aberta e fria que nunca cansa de ser dúvida, que não cessa da convicção de não saber quem sou.
"A vida inteira estive em tudo como um deus, eu era todas as coisas de uma só vez, era a prece e a sentença, a entrega e a perdição, as juras e todo o pecado. A vida inteira cabia em mim porque eu era a vida inteira dentro de mim, até perceber que eu faltava a mim... perdi tudo sem nunca ter tido coisa nenhuma".