20 dezembro 2007



NATAL
“Estou pensando em Deus, estou pensando no amor”

O espírito natalino nos deixa meio sentimentais, é verdade, dá vontade de chorar por tudo. É uma época que reaproxima a gente da gente mesmo, isso nos torna mais seres humanos. Mas antes, o natal era muito mais belo do que hoje em dia, a palavra que definia natal era amor. Não havia outra. Amor em todos os sentidos, nos olhares, nos sorrisos, nos abraços, nos beijos. Isso mesmo, amor. Amor ao próximo, amor à vida, amor às estrelas, às árvores, aos bichos. Amor para além da vida, amor capaz de transformar tudo e todos. Era um tempo em que todos os sentimentos floresciam novamente, os namorados eram mais felizes, sorríamos mais naturalmente, perdoávamos muito mais. Os ricos saudavam os pobres. Saíamos às ruas para apertar a mão de qualquer pessoa.
Hoje, não há mais tempo para uma palavra de amor, hoje se manda apenas um presente com um cartão eletrônico que diz, no nosso lugar, “Feliz Natal”. Nós vivemos presos demais às obrigações cotidianas, às coisas supérfluas. Os pais têm o trabalho, os filhos, a escola e as baladas. Quando um estranho nos sorrir nos parece fora do comum. Os pobres deixaram de ser humildes para se tornarem uma ameaça aos ricos. Os mais necessitados atrapalham, os ricos temem aperta-lhes a mão, há um olhar de repudio onde deveria existir amor ao próximo. Os amigos não são mais escolhidos pelo diálogo, pela afinidade, mas pela classe social.
A verdade é que não parece haver mais uma palavra que defina o natal. Quem sabe o “consumo” seja a palavra da moda. O gesto de trocar presentes agora é uma obrigação sem amor, dar-se aquilo que se quer ganhar. Não há mais o mistério que tanto iluminava o Natal. O famoso papai Noel não é mais o velhinho que põe os presentes em baixo da cama, ao lado da árvore de natal. Agora, ele está nas lojas, nos outdoors. É só ir ao shopping, você pede e ele aponta a vitrine, assim o natal está completo. Talvez no lugar de perguntar às crianças: “o que você deseja ganhar nesse natal?”, ele diga: “Seu pai tem cartão de crédito? Então leve o que quiser, pirralho”.
É por tudo isso que pra mim o Natal não é mais o mesmo. O maior símbolo do natal parece estar meio esquecido no meio disso tudo. O menino Jesus na manjedoura, em meio às ovelhas e às vacas, parece que não nos comove como antes. Lembro como me encantava ir à igreja na noite de natal e ouvir:
“Tudo seria bem melhor, se o natal não fosse um dia, se as mães fossem Maria e se os Pais fossem José e se a gente parecesse com Jesus de Nazaré. Estou pensando em Deus, estou pensando no amor”.
Tínhamos essa certeza, e acho que ainda a temos, guardada em algum lugar dentro de nós. Pensar em Jesus é pensar no amor, pensar em natal tem de ser pensar nesse amor. Talvez esta seja a maior razão das pessoas não praticarem o amor como antes, porque, no natal, Jesus ficou pra segundo plano. As pessoas não se dão mais às mãos durante a ceia para rezar. Não conversam mais.
Então, eu decidi que o mais importante hoje seria falar sobre esse menino, o meu menino Jesus.
Acredite, eu posso ouvir a voz do meu menino Jesus, ver sua face, tocar sua pele. Conheço a cor dos seus olhos e o brilho do seu sorriso. Meu menino Jesus é um Deus que é humano, o imenso que é pequeno, o invisível que pode ser visto e tocado e sentido. Tudo porque eu reconheço o meu menino Jesus em todas as pessoas que amo, ou deveria amar, ele está presente em mim, dorme dentro da minha alma. O meu menino Jesus não é um símbolo de natal, ele é vivo e nasce hoje em mim como todos os dias. E é por isso que eu tenho certeza que esse é o menino Jesus verdadeiro.
Pra mim, pensar no natal é pensar nele, é pensar em Deus, no amor. E aí, eu canto:
“Estou pensando em Deus, estou pensando no amor”.

Geovane Belo

05 dezembro 2007


INFINITO SEM HORA

Minha felicidade é sem idade
singular
sigo lá no fundo dos seus olhinhos
o meu olhar
consigo vê-la sorrindo
e só isso basta pra viver
vão-se os segundos
vão-se os receios.

o meu sonho nada nesses olhinhos de mar
repousa leve nos seus seios...
em mim nada mais existe,
em mim nada mais é triste.

Nesse infinito sem hora
quero que tudo passe e me leve
Eu me perco na sua boca que me olha
eu me perco nos seus olhos que me beijam

coisa louca que me cura
é essa loucura de amar e não ter medo.


Geovane Belo, 5 de dezembro.

27 novembro 2007

Com VIDA

como a vida
comovida
convida?

como o passo num leve
compasso leva
o passado?
passa!

como a meta
como um cometa
acomete a mente?
mete! mente!
come!

como a ação
como um são
e a comoção
na canção
cansam a vida?
divi - dida
vida
vida
a vida convida
a
vida
com vida.

06 novembro 2007

FACE
Eu vejo a minha face
do presente
nela passado é presente.
Eu vejo o tempo
muito a frente
na minha face,
na minha mente.
Eu vejo a minha face
daqui a 50 anos e a gente,
a mesma cara de menino te olhando
Eu vejo, a vida pressente
teu menino cresceu
e não mudou o que sente.

05 novembro 2007

Sonopoema


Escrevo enquanto durmo
isso me fere o sono.

Escrevo, escrevo
tanto sonho escrito no sono
assonâncias, ânsias,
assonhâncias.

Ronco, babo, deliro
me enrosco na colcha
e no travesseiro do verso.

Depois acordado tudo se foi
nem um verso a mais perambula
insone pelo quarto,
nada, nada, nadinha.

Pensamento perdido
ou encontrado?
O poeta verdadeiro dorme
ou desperta?

Os mais lindos poemas
ficarão para sempre
dormindo dentro de nós
sonolentos
O homem acordado sonha lento
e o poeta que dorme nele
talvez nunca mais acorde
do seu sono lento.



Geovane Belo, 06 de novembro

abra a obra
manobra
mãos à obra
sobra
dobra
cobra

arte obriga
briga
mão artista

obriga-do
a o
manobrista

13 outubro 2007

DES-Ped/aço


caminho pelos espaços vãos
perdi a sorte, perdi a calma, a hora
perdi o bonde, perdi isso...
um corte na testa, outro na alma
isso atesta o coração contrito
isso atesta que a vida é um saco

estou um caco
em atrito com o mundo
estou escasso,
obcecado com tudo

e ainda ressacado e aflito
e com os nervos e a paz
desarticulados

não sou capaz de sustentar
a vida na sua casca

o corpo não é mais feito de aço
o dia despencou,
as contas venceram

a carteira de cigarro amarrotou,
estou duro, sem a metafísica
e sem mulher.
(o pior é estar sem mulher)
qualquer sensação
aparente sustentável humana
me despedaça
o vazio enfarta

me tomaram a carteira
o relógio
caí, pisei no cadarço

estou sozinho demais
para caber na minha solidão,
as roupas amarrotadas no chão
no chão também meus pedaços


a vida surrupiou o tecido dos sonhos
e devastou um coração que era vento
vasto

eu me perdôo pelo que
não fui e não fiz
por fazer o que não faço

porque, em verdade,
eu nunca fui o que sou
eu nunca fico,
eu sempre passo.


Geovane Belo, modificado em 21 de outubro




30 setembro 2007


Eu queria ser largo e belo feito o vento


Eu é que passo
E não o tempo.
Sem pele e sem tato

Tento tocar tua pele
com meu tato
intenso.
Tento sem voz e sem pressa
Levar ao teu ouvido
meu som de silêncio puro
e atento.
Tento sem cheiro e sem corpo
Lamber tua carne
impregnar meu cheiro lento
do teu perfume
que exala a doçura da vida
e o alento.
Tento sem pernas e sem pressa
Passar por ti
E te fazer me notar sem me ter
sou o estado sem pessoa
que está contigo
imenso
Eu queria passar, a qualquer hora,
Pelas brechas do teu rosto
que é triste,
e imerso em ti,
ir sem rumo ao teu infinito
caminhar nos descaminhos dos teus pés.
Infiltrar-me
Encarcerar-me
Nos anseios que invento
Com a minha língua seca
delinear tuas formas
Porque eu não sou mais eu,
Sou tu.
Vem, tu,
desenhar em mim o teu feitio,
Eu queria ser feito no teu cabelo
Largo e belo feito o vento.

22 setembro 2007

O amor entrelaça desejos, estreita caminhos, constrói mistérios. Só que, às vezes, retrai, omite, definha a gente que ama. O amor que é ar, também sufoca, dispersa a vida, confunde a cabeça. Ele, que é nosso parceiro, torna-se nosso inimigo, o assassino que nos esgana com as mãos pesadas da solidão. Os caminhos desse sentimento são duas estradas que se cruzam: uma leva à vida, outra, à morte.

16 de setembro de 2007.

03 junho 2007

Empinador de pipas

Sou Eolinho, o empinador de pipas,
pela linha firmemente erguida
o céu vem até mim.
A vida suspensa no ar
é parte do meu corpo
parte de mim
bailando sobre o ritmo do vento.
Bem longe, o rabo íngreme
e o peitoral bem aprumado
são os meus pés e o meu peito
recortando o azul do universo,
trajando a seda da liberdade.
Minha pipa, vivinha da silva,
também será cortada e vai chinar.
Mas, sendo ela parte do meu corpo,
na outra rua haverá um outro empinador
que dirá: “Ao vai-te, ao vai-te!”
E no bailar da queda meu corpo-pipa
será objeto de cobiça dos seus olhos
e ao cair nas mãos dele, sem tocar o chão,
com a firmeza de outro carretel,
de outro cerol
novamente ganhará o céu
formando um conjunto de vidas numa única pipa
Seremos vários corpos suspensos no ar
encantando os olhos de quem,
no chão, sonha um dia também ser pipa.

27 maio 2007


erro de pessoa


hoje estranhamente me vi
como quem enxerga algo perdido e tem dó
eu estava ali diante de mim
sem a esperança comum a minha idade
alheio à cor dos sapatos e da camisa
à marca de cigarro entre os dentes
e às coisas todas insólitas do amor

assim, escapou-me, por descuido,
esse eu mesmo corriqueiro
como um copo de vinho escorre dos dedos
e ganha o chão
arremetido ao solo,
os cacos de mim olharam-me
e eu me olhei, pobre de mim,
aos estilhaços, um ser sonhado,
um ser EU...

o ser humano sem graça, crente de tudo
- inclusive no amor – que eu era.

profunda e intensa saudade vivi
fitando meus pedaços, pois, agora, sem mim,
comungava a presença da minha solidão
eu era apenas uma falta sem falta
o pior vazio é aquela feito apenas de vazio
senti um não-ter–o-que-sentir

e assim vago seco oco
achei-me parecido demais com ninguém

e confesso isso ao eu perdido,
como apelo às esperanças também perdidas,
confesso isso, que não sei, ao vento,
às paredes, aos ouvidos surdos desse espírito desespirituoso
e confesso, porque não confiei manter no coração

essa sensação de estar sem sensação,
de que o coração é um deficiente completo
para tratar das coisas do coração

a razão deste poema é não ter razão para um poema,
é essa falta de enredo ou de argumento, ou de poeticidade
quantos minutos desse instante de vida perdi aqui
bajulando um poema que não quer sair?

e vós, ao olhá-lo, quanto perdeu?
tende nos olhos e na língua pena desse eu,
que talvez alguém apelide “eu – lírico”, mas lirismo nenhum viveu

tudo aqui é inutilidade de verbos, versos, ventos...

melhor, então, encerrar com o que é sem razão,
essa falta de lógica despretensiosa e prosaica,

desde o início não tinha mesmo nada a dizer

(.) ponto-final

16 março 2007


Borboletinha nos olhos de Lorena

Minha alma, uma borboletinha perdida,
À procura de uma flor
invadiu o quarto de Lorena
e ficou presa se debatendo nas paredes
do coração da menina.
Voou pra lá, voou pra cá
E não consegui encontrar
a janela para fugir.
Depois, pousou num dos olhos dela
E, pobrezinha da borboletinha,
toda derretida, apaixonou-se
pela lua cristalina que viu lá dentro.
Ficou ali parada ao redor das pálpebras
Beijando a lua que a fitava
Como se beijasse a mais bela flor,
Como se beijasse a primavera toda.
Minha alma, borboletinha que andava perdida,
Sabe que a vida é curta
Mas, como sabe amar,
Decidiu viver infinitamente os seus dias
Voando, amando essa vista de lua,
beber o néctar das lágrimas da menina
se banhar no orvalho dessa flor-morena
e fazer que o céu respingue amor
sobre a vida de Lorena.

Quem sou eu

Sou o que ninguém sabe e o que todo mundo conhece ou cobiça saber. Não me compreendem porque não me entendem. Não me entendem porque não me compreendem. É fácil. Se há certeza, é a duvida de tudo. Se há dúvida, é a certeza apavorante de não saber nada disso, nem daquilo, nem de coisa alguma. Não sou paradoxo, nada de versos sobre minha exatidão, sou imprecisão exata, abstração concreta, sou eu, só eu tão mim-mesmo. Se me queriam outro, por que procuram-me? Procurem outro, ou escavem esse outro em mim, tenho milhares de mins num eu. Ora, sou matéria palpável e dita de um absurdo impalpável e indizível. Só me entende quem não me quer entender. Não sou resposta, já disse, nem tenho respostas, sou a pergunta aberta e fria que nunca cansa de ser dúvida, que não cessa da convicção de não saber quem sou.
"A vida inteira estive em tudo como um deus, eu era todas as coisas de uma só vez, era a prece e a sentença, a entrega e a perdição, as juras e todo o pecado. A vida inteira cabia em mim porque eu era a vida inteira dentro de mim, até perceber que eu faltava a mim... perdi tudo sem nunca ter tido coisa nenhuma".