30 setembro 2009

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29 abril 2009

O fruto da Felicidade

Antigamente eu acreditava na felicidade como uma paisagem próxima, e peregrinava à toa, pelos acostamentos, e ruelas, infeliz de dar dó. Tinha pés calejados, cabeça baixa, mas me entupia de expectativas rumando ao futuro glorioso reservado pelos deuses a mim. Todavia, o tempo escorreu pelos córregos da vida, (quando o tempo se esvai, os castelos utópicos costumam desabar). E não é que desabaram. Meus palácios, minhas muralhas, meus bordéis, todas as colunas da minha existência fantasmagórica despencaram. Já não acredito que a estrada me conduza a um mundo de delírios intermináveis: risos incontidos, nuvens de algodão, rios de chocolate, árvores de bombom. Não creio mais na fantasia ingênua que alimentava o conto de fadas da minha imaginação.

Não confio mais na felicidade, quer dizer, não como antes, agora acredito apenas no caminho, no trajeto. Não busco chegada, apenas me nutro no fluxo tranqüilo dessa jornada. Não ergo meus olhos para alcançar o que não posso ver, não olho para trás para tentar recuperar as imagens que perdi de vista. Não levanto a minha voz para que me ouçam além de aqui. Estou atento às coisas da estrada, aos transeuntes apressados, aos percalços, à neblina na manhã, aos pedintes, aos sem afeto, ao céu alaranjado das tardes dominicais, às primeiras estrelas que inesperadamente somam-se no escuro. Olho para noite sem pensar no dia, e vivo o clarão do dia sem pensar que a noite virá. Comungo cada tempo na dosagem certa de seu instante.

Nas minhas veias não há uma adrenalina irrefreável, uma espécie de orgasmo infinito, feito de sonhos açucarados e fanfarras arrebatadoras. E, por mais que não habite o sétimo céu nem sonhe mais com ele, não carrego uma fadiga persistente na carne, amortecendo meu riso. Levo somente uma quietude nem feliz nem triste, uma serenidade vazia e silenciosa em cada passo dado.

No espelho diário, enxergo um ser que ri sem exageros e chora sem demasiada dor. Considerar-me-ia feliz? Talvez devesse, mas a fortuna da felicidade ilimitável que vivificamos em relances na vida, deixa depois uma amargura ácida, uma via-crúcis na alma. Os momentos de alegria avassaladora, intensa, aqueles minutos quase irreais, se prolongam em horas e dias de uma solidão descomunal. Quando o encanto do prazer se rompe, abre-se uma cratera de quilômetros e nela afunda nosso coração. A maioria de nós deseja uma felicidade carnaval, risos absurdos, gozos ininterruptos, amores eternos, amigos perfeitos, vida financeira sempre estável, farras sem ressaca. A verdade é que toda glória precede o fracasso, a depressão, a nostalgia, a fossa.

Por tudo isso, não desejo a felicidade absoluta: viver amores platônicos, grafar meu nome na memória dos livros, comprar um iate, aparecer na tevê, casar com aquela moça... (provavelmente ela lerá isto aqui, estratégia inconsistente, hoje as pessoas pouco se apaixonam pelas palavras).

Sinto que cresci comigo, hoje anseio a calmaria dos instantes reais, feitos apenas da matéria do presente, feitos de inconstância, da seiva inesgotável de agora, da imperfeição dos beijos que se vão com o passar das horas, os instantes feitos de algo que se vai para nunca mais voltar.

A maioria das pessoas supõe uma ventura desenfreada em carros supersônicos, em apartamentos com frente para o mar. É feliz quem tem um parceiro do tipo capa de revista, quem tem fama e dá autógrafo. O ser comum odeia ser comum, o anonimato é triste. Aspiram, tresloucados, a esse tipo de felicidade, listam prováveis conquistas materialistas e emocionais, e lá se vão atrás da felicidade, reservando para futuramente a sua fortuna. Resultado: nunca chegam ao amanhã sonhado e consomem a magnitude dos momentos recentes na ilusão do porvir.

Eu, no entanto, cultivo o jardim da paciência. Semeio boas gargalhadas, rego com as minhas lágrimas o chão do presente, dia após dia, contemplo o crescimento de uma plantinha, ela se enraíza na minha carne. Demora anos para crescer, mas dá frutos desde o começo, são poucos e de um sabor espantoso, alguma coisa meio doce e meio amarga que fica na boca por algum tempo, até se desfazer por completo dentro de mim.
Esse fruto chamo de felicidade.

31 março 2009

A verdade sobre a mentira

Consideramos a mentira uma manifestação praticada por alguém em benefício próprio. Há, obviamente, níveis e tipos de mentira. Há também níveis e tipos de mentirosos.
No entanto, (com o perdão do jogo de palavras) uma pequena mentira pode vir a ser uma grande verdade. Não na concepção de quem a pratica, mas na de quem dela se alimenta.

Como o ato de mentir é uma atitude isolada - uma conduta individual sobre o meio social - caso não seja descoberto pode se disseminar, tornar-se um fato e passar a condição de verdade coletiva. Por exemplo, um homem tachado como louco, mesmo não o sendo, será louco até que não se prove publicamente a sua sanidade mental (outro conceito relativo). Os outros não o verão como realmente é, mas como a maioria o enxerga. Não obstante, a loucura é sempre um julgamento dos outros em relação a alguém. Não de alguém em relação a si mesmo. Nenhum louco é louco o bastante para se considerar doido varrido.

Mas, desmascarada a mentira, além do constrangimento sofrido por quem a cometeu e da indignação dos ludibriados, ela pode receber outras denominações. São sinônimas a calúnia, a traição, a picaretagem, a falsidade e a blasfêmia... Gosto de uma, em especial: a perfídia. Pérfido é aquele que, para parecer convicto, jura por Deus que a mentira é verdade.

Também é mister afirmar: a mentira é uma invenção humana fruto de outra invenção humana, a linguagem. Nós, humanos e humanamente falantes, falamos de nós e falamos dos outros e das coisas dos outros. Avaliamos, julgamos, contestamos nossas ações, nosso comportamento, nossa aparência e nossa condição. Assim mesmo o fazemos com as ações, o comportamento, a aparência e a condição dos outros. Os nossos pensamentos verbalizados não afetam só as nossas considerações a respeito de algo, mas mobilizam as mudanças de pensamento e verbalização grupais. Se eu digo Alfredo é chato, ainda que Alfredo não aja como um chato, esta afirmação pode levar alguém a vê-lo como uma pessoa irritante. E Alfredo pode não só ser considerado chato como, verdadeiramente, irritar alguém.

A comunicação humana se dá por meio da interação entre os seres. Neste contato, somos induzidos a revelar ao outro nossas experiências no mundo e nossas opiniões sobre mundo. Obviamente, no jogo verbal, dizemos o que vemos à luz dos nossos olhos, dizemos o que pensamos à luz dos nossos pensamentos. Isso faz com que nos tornemos manipuladores, porque o que dizemos é moldado pela nossa retina, pela nossa mente. Por isso mentimos, porque dizemos não a verdade sobre o mundo, mas a nossa verdade sobre o mundo.

A construção das nossas falas resultam das nossas intenções, tantas vezes inconscientes. É a intencionalidade que nos arrasta para o mar das mentirinhas cotidianas. Mentimos para impressionar, convencer, não decepcionar, não irritar, não iludir. A maioria das mentiras que criamos são despretensiosas. Quando descrevemos um objeto de desejo a alguém, somos fieis a nossa impressão sobre esse objeto; só que a sedução embaça, pode corromper a legitimidade do que é descrito. Descrevemos, então, as coisas não como são, mas como as vemos.

Já a mentira de cara lavada, como é conhecida, ocorre de maneira diferente. Mentimos com plena convicção quando a verdade não parece ser a melhor escolha. Você e seu amigo gostam da mesma pessoa. Por mais que amizade seja sincera, dizer a ele o que você sente soará como traição, melhor dizer que gosta de outra e não causar atrito. Note! Uma criança não mente maldosamente, mas por medo de ser repreendida por uma ação praticada. Numa escola, o aluno se esquece de fazer o trabalho de português, melhor afirmar que ficou em casa, ou a impressora estava sem tinta, talvez o PC quebrou. Suponha que você tenha saído com uma moça que não beija bem, e ela pergunta se você gostou. O que responde? Ou muito pior, você traiu sua namorada, pode ter até se arrependido, mas sabe que se contar perde o seu amor. Se for descoberto, nega ou confessa? A mentira é para a Bíblia um pecado capital, só que nem sempre é possível manter a plena sinceridade dos Deuses. Logo, vamos dividir a mentira em dois planos: as justificáveis e as injustificáveis.

1. Há pessoas que mentem para conquistar um emprego, dizem que tem experiência no ramo, já fizeram isso e aquilo. Há outras que mentem para conquistar alguém, dizem nunca trair, não gostam de briga, não são ciumentos e blá-blá-blá. Você vai visitar um cara à beira da morte, não sai mais da cama, quase não fala, não come, você vai lá e diz: “Tenha fé, você vai sair dessa”. O casamento de vocês já dura mais de uma década, a intensidade do amor se foi e você ainda diz todos os dias “eu te amo”, porque ainda há respeito, cumplicidade e uma linda família. Mentira abonada. Florbela espanca escreveu: “quem disse que pode amar alguém durante a vida inteira é porque mente.”

2. Há outra classe, a dos mentirosos maldosos. Mentem porque sentem inveja, querem sujar as qualidades do adversário, torná-lo inferior, menos digno de aplausos. Vocês fazem o mesmo trabalho na empresa, mas o seu colega foi condecorado, elogiado, pra você nem as migalhas. Você, então, começa a falar que ele não cumpre os horários, que ele copia os trabalhos da Internet, etc. Você gosta do namorado dela, então você espalha que ela não presta, só pensa no dinheiro dele, é uma safada, sem graça e interesseira. O mentiroso mal intencionado quase sempre quer superar o opositor, e a mentira é sua arma. Um outro tipo de mentiroso é aquele que convence os outros e torna a mentira uma cadeia de destruição. Adolph Hitler manchou de sangue o mundo quando convenceu que os judeus eram impuros, tinham de ser exterminados. Mentira intolerável. Um político corrupto uma vez disse "o que é bom a gente mostra, o que é ruim a gente esconde".

A verdade mesmo sobre a mentira é que mentimos porque gostamos da verdade. A verdade que entusiasma. Mentimos por esperteza, para tornar algo mais atraente, mais divertido (o mote das piadas é o exagero), alguns mentem por vileza, por cultivarem a raiva e serem peças frágeis, diminuídas pela própria ignorância.

Assim como há verdades que precisam ser ditas, há mentiras que são aceitáveis. A mentira pode ser a verdade que convence. E a verdade ser a mentira, posto que não satisfaz.
Como afirmou Millôr Fernandes: Jamais diga uma mentira que não possa provar.

13 março 2009

A ocupação dos territórios do nosso coração masculino

OBS.: Esta mensagem, apesar do dia intencionado às mulheres, é destinada aos homens presos ao cativeiro de algum rabo de saia feminino.

Definitivamente não há como fugir. Estamos no meio de um conflito armado. Elas invadiram o nosso território, devastaram o acampamento onde nós estávamos refugiados, a batalha foi perdida antes mesmo de iniciada a guerra. Nós, homens, fomos obrigados a prestar continência, a obedecer às imposições delas e teremos de saciar todas as suas carências afetivas, de presenteá-las com brincos, vestidos, hidratantes e, principalmente, flores, muitas flores e chocolate.

Você, que é homem, já deve ter percebido. Nenhum de nós pode se libertar das amarras de uma mulher. Por mais que você dê uma de machão, negue, jure de pé junto que não tem nenhuma na cabeça, que é o único sobrevivente dessa emboscada feminina sobre nossa vida varonil, certamente você não passa de mais um pobre refém choramingando por um colo de mulher.
Já nascemos em meio a este combate e elas são as detentoras de todo o arsenal. Crescemos assim, fomos treinados por uma comandante, uma general impositora, mas também dedicada e leal à sua missão: nossa mãe. Com ela aprendemos a ser homens de verdade. Depois crescemos e outra tropa começou a espreitar o nosso território. Vieram as mulheres que foram treinadas para nos deixar malucos, para nos fazer subir paredes, e até chorar, às vezes. Essas possuem armamento pesado, a artilharia é sempre a mesma, mas é a quantidade de armas que nos apavora.

Elas surgem na selva da sua vida, quando você pensa que está livre de todos os perigos. Desestabilizam você com um perfume doce, do boticário, da natura, ou um bom francês. Deixam você chocado com um decote, com um corcelê, ou um top. Perturbam sua mente quando vestem aquela calça capri, ou aquele jeans decotado da Planet, da Ellus, da Diesel, Fórum, Zoomp (quanta marca!). Quebram você no meio quando calçam aquele salto fino, ou plataforma e pintam os lábios de um batom vermelho, ou escolhem um simples brilho com aroma de fruta. Não bastasse tanta pressão, elas ameaçam a sua integridade física e moral com a mais desconcertante arma: o olhar. Qualquer piscadela torna-se uma terrível intimidação, os cílios longos bem delineados são estarrecedores, porque o rimel é a munição. Ainda tem aquelas que esnobam seu poderio mostrando a barriguinha com um piercing, ao qual é impossível resistir. As academias de ginástica se tornaram centros de treinamento, onde elas preparam o corpo e a mente para a luta, ali em conjunto elas montam planos e estratégias.

Você toca o rosto dela e perde-se em meio a todos aqueles aparatos: o pó compacto, blush, gloss, base e ainda lápis de olho e sombra realçando a sensualidade dos olhos. Não dá pra ser forte. Pedimos remissão, clamamos por paz, mas mesmo assim temos o coração fuzilado. Morremos, só para mais tarde renascermos e morrermos de novo, infinitas vezes.

Não há resistência, já foi feita a ocupação dos territórios do nosso coração masculino. Mas precisamos confessar que não há fim mais desejado por um homem do que ter o coração raptado por uma mulher. Elas levam seu pobre coração para um cativeiro, põem uma mordaça nele e o cegam, o mais provável é que o torturem com carinhos, beijinhos e o façam gritar, gritar muito. O pior de tudo é que elas vão morder, cheirar, amassar, beliscar seu coraçãozinho todo, e quando você tiver a chance de libertá-lo, ele não sairá de lá nem morto. Elas podem até querer expulsá-lo, mas você verá que ele já estará servindo o esquadrão delas, viverá para satisfazê-las, seu coração será um soldadinho tolo e só conseguirá sair de lá se for raptado por outra tropa.

Esta é uma guerra a qual nenhum homem quer sobreviver, pois todos anseiam pela salvação e sabem que o melhor é deixar-se morrer debaixo de um bom rabo de saia. O que podemos fazer? Nada!
Estamos perdidos! Então, vamos morrer e morrer e morrer... Nossas inimigas sabem como nos
vencer, e não há nada melhor do que morrer feliz.

31 dezembro 2008


Um ano novo

Na virada de ano, é lindo ver todos se vestirem de branco, grande parte esvaziando as cidades em direção às praias, muitas confraternizações, shows com fogos de artifício. Entretanto, muitas dessas pessoas estão com o coração em luto, revestido pela mágoa, desejo de vingança, desconfiança, raiva. São filhos que odeiam a companhia dos pais. Pais que ofendem os filhos. Amigos que perderam a confiança no outro por qualquer futilidade. Há maridos e mulheres para quem o amor virou cumplicidade. Desse modo, qual o propósito do júbilo?

A festa de ingresso em 2009 para essas pessoas é um roteiro, os personagens trajados de branco são fictícios. Não se pode revestir um ano de novo cultivando amargura, insegurança e cólera. Não há como torná-lo claro, se corre ferrugem nas veias da alma.

Muitos acreditam que a partir de janeiro, tudo muda. Nova fase, novos rumos. “Nesse ano que vem, vamos estudar mais, vamos fazer mais amigos, vamos viajar, vamos para faculdade, vamos para um emprego melhor, vamos fazer amor, vamos, vamos, vamos...” E a maioria não vai a lugar nenhum, porque estão amarrados às enfermidades da hipocrisia. Não adianta almejarmos o mar se estivermos presos ao cais.

Há duas maneiras de preparar um ano novo. A primeira é a que se convencionou nestes tempos. Você senta diante do computador, escolhe uma mensagem qualquer, dá um clique e todos os seus amigos, conhecidos, inimigos, quem tiver na rede recebe seus votos de um próspero ano. Depois, você se prepara para a grande noite, compra roupa, bebida, cigarro, camisinha, telefona para uma galera irada e vai zoar.

A segunda não é tão underground assim, é uma escolha de poucos, você vai à casa do seu amigo de anos e pede perdão por estar distante, diz pros seus pais que vai tentar ser um filho melhor. Tenta perdoar, arrumar o quarto, fazer uma prece. Você não precisa comprar cartões, nem se vestir todo de branco, o mais importante é distribuir abraços, ajudar a arrumar a mesa e sorrir às pessoas que realmente se importam com você. Ficar porre, pular ondinhas, soltar pistola não são obrigações. Nosso comprometimento tem que ser fortalecer os laços, ser prestativo, companheiro, humano.

O amor para alguns se tornou uma expressão vergonhosa. Há medo em torno do “eu te amo”. Você já se perguntou o quanto é importante dizer o amor a quem você ama, não precisa gritar, Ora! Fale baixinho, amor não pode ser arquivado pelo silêncio. O tempo passa, deixar palavras essenciais para depois pode ser tarde. Você já parou para pensar como as coisas, há alguns anos, eram bem diferentes em sua vida? Provavelmente muitas pessoas sumiram, os lugares que você freqüentava eram outros, os seus desejos também. Não foi só isso que mudou, falta tempo para estar em casa, os pais chateiam com os sermões, amigos viraram companhias de festa.

O certo é que, todo tempo, estamos encerrando fases. Só que para um ano ser novo, não é necessário um ritual, fazer uma lista de intenções, é preciso fazê-lo novo, vivê-lo novo, o que me diz de um checape? Diagnosticar o que pode torná-lo mais afetuoso e por em prática uma restauração de si próprio é uma boa dica. A cada novo ano, estamos mais velhos, mais seguros de nós mesmos, mais certos do que queremos, porém as horas levam muito de nós.

“Este ano quero paz em meu coração, quem quiser ter um amigo que me dê a mão”. Um ano de prosperidade e paz não se edifica com projetos mirabolantes de sucesso, do tipo vamos fazer... vamos comprar... vamos construir... vamos... É feito de desejos regados, paixões adubadas, perdões ofertados.

Que tal, nesse ano vindouro, engolir a experiência dos mais velhos? Parar de enxergar só os defeitos? Podemos conjugar, no dia-a-dia, verbos como agradecer, consolar, confiar, animar, ajudar, entender, esperar, repensar, SENTIR. Acreditar que 2009 será um ano só de triunfos é inocência, precisaremos também de forças para enfrentar as adversidades, pagar as contas, suportar as perdas, encarar as decepções. Vamos aprender, neste ano novo, que para pintá-lo de novo é preciso entender aquilo que só o tempo sabe ser: maestro dos sonhos, assassino dos instantes de prazer, artesão das lembranças e mestre da vida.
* (Geovane Belo)

24 dezembro 2008


NATAL
“Estou pensando em Deus, estou pensando no amor”

O espírito natalino nos deixa meio sentimentais, é verdade, dá vontade de chorar por tudo. É uma época que reaproxima a gente da gente mesmo, isso nos torna mais humanos. Mas antes, o natal era muito mais belo do que hoje em dia, a palavra que definia natal era amor. Não havia outra. Amor em todos os sentidos. Amor para além da vida, amor capaz de transformar tudo e todos. Era um tempo em que todos os sentimentos floresciam novamente, os namorados eram mais felizes, sorríamos mais naturalmente, perdoávamos muito mais. Saíamos às ruas despreocupadamente para apertar a mão de qualquer pessoa.

Hoje, não há mais tempo para uma palavra de amor, hoje se manda apenas um presente com um cartão eletrônico que diz, no nosso lugar, “Feliz Natal”. Nós vivemos presos demais às obrigações cotidianas, às coisas supérfluas. Os pais têm o trabalho, os filhos, a escola e as baladas. Quando um estranho nos sorrir nos parece fora do comum. Os pobres deixaram de ser humildes para se tornarem uma ameaça aos ricos. Os mais necessitados atrapalham, os ricos temem aperta-lhes a mão, há um olhar de repudio onde deveria existir amor ao próximo. Os amigos não são mais escolhidos pelo diálogo, pela afinidade, mas pela classe social.

A verdade é que não parece haver mais uma palavra que defina o natal. Quem sabe o “consumo” seja a palavra da moda. O gesto de trocar presentes agora é uma obrigação sem amor, dar-se aquilo que se quer ganhar. Não há mais o mistério que tanto iluminava o Natal. O famoso papai Noel não é mais o velhinho que põe os presentes em baixo da cama, ao lado da árvore de natal. Agora, ele está nas lojas, nos outdoors. É só ir ao shopping, você pede e ele aponta a vitrine, assim o natal está completo. Talvez no lugar de perguntar às crianças: “o que você deseja ganhar nesse natal?”, ele diga: “Seu pai tem cartão de crédito? Então leve o que quiser, pirralho”.

É por tudo isso que pra mim o Natal não é mais o mesmo. O maior símbolo do natal parece estar meio esquecido no meio disso tudo. O menino Jesus na manjedoura, em meio às ovelhas e às vacas, parece que não nos comove como antes. Hoje quando vamos às igrejas na noite de natal, preocupamo-nos muito mais em apresentar nossas novas roupas e sapatos e bolsas. Lembro como me encantava ir à igrejinha próxima e ouvir:


“Tudo seria bem melhor, se o natal não fosse um dia, se as mães fossem Maria e se os Pais fossem José e se a gente parecesse com Jesus de Nazaré. Estou pensando em Deus, estou pensando no amor”.

Tínhamos essa certeza, e acho que ainda a temos, guardada em algum lugar dentro de nós. Pensar em Jesus é pensar no amor, pensar em natal tem de ser pensar nesse amor. Talvez esta seja a maior razão das pessoas não praticarem o amor como antes, porque, no natal, Jesus ficou pra segundo plano. As pessoas não se dão mais às mãos durante a ceia para rezar. Não conversam mais.Então, eu decidi que o mais importante hoje seria falar sobre esse menino, o meu menino Jesus.

Acredite, eu posso ouvir a voz do meu menino Jesus, ver sua face, tocar sua pele. Conheço a cor dos seus olhos e o brilho do seu sorriso. Meu menino Jesus é como o do Pessoa é um Deus que é humano, o imenso que é pequeno, o invisível que pode ser visto e tocado e sentido. Tudo porque eu reconheço o meu menino Jesus em todas as pessoas que amo, ou deveria amar, ele está presente em mim, dorme dentro da minha alma. O meu menino Jesus não é um símbolo de natal, ele é vivo e nasce hoje em mim como todos os dias. E é por isso que eu tenho certeza que esse é o menino Jesus verdadeiro.Pra mim, pensar no natal é pensar nele, é pensar em Deus, no amor. E aí, eu canto:

“Estou pensando em Deus, estou pensando no amor”.

08 novembro 2008

Vida...
"Pensar é estar doente dos olhos"

Vocês já pararam pra pensar na razão da vida? Quantas vezes você se pegou pensando nos seus amores que ficaram no passado, ou naqueles platônicos que nem se souberam amados por você? Esses dias eu também me peguei buscando juízo para essa doidice que é a vida. Felizmente, a tempo, achei meio sem lógica tentar encontrar porquês para meus dias, que nada são além de dias, por isso devem ser vividos como tal e não como uma faculdade de autoconhecimento.

Entendi que, na verdade, esse é o nosso maior pecado, teorizamos demais os sentimentos, fazemos terapia, tentamos entender cientificamente determinadas atitudes do nosso ser, como se tudo estivesse nos livros. Adoramos expor nossos problemas para os amigos e torná-los maiores do que são, como se os outros pudessem compreender aquilo que faz parte da nossa alma. Quanta ingenuidade! Cada ser humano só pode conhecer os limites da sua própria alma - e ainda em parte- tentar entender o universo do outro é invadir um mundo que não é seu.

Quando se pensa demais numa justificativa para um abraço, para um aperto de mão, para um beijo, perde-se metade da química que naturalmente leva os corpos a se abraçarem e se beijarem. Acredito agora que nossa solidão diária, por exemplo, resulta muito mais das expectativas criadas pela nossa mente, das hipóteses que nós erguemos em relação a alguém, e por pensarmos demais num ideal de amor, num ideal de amigo, num ideal de pais, de trabalho, de transa, num ideal de sei-lá-o-quê, nada torna-se ideal ao nosso espírito neurótico e secuelado.

Li em Shakespeare, Gandhi, Vitor Hugo, Chaplin, etc. em tantos outros, muitos bons conselhos para se viver plenamente, mas aprendi que não há direcionamento que nos faça mudar o foco da nossa própria vida, porque nós somos os únicos que temos poder sobre as nossas atitudes, sobre nossas aspirações, e ninguém pode interferir com palavras nas nossas experiências tão impossíveis de serem descritas. Essa coisa de aproveitar cada dia como se fosse o último, de CARPE DIEM, soa muito bem, é bonitinho mesmo, mas só funciona mesmo na literatura, na arte. Não há filosofia que explique as manifestações extraordinárias que diariamente dormem e despertam conosco. Quando raciocinamos demais na procura do ser perfeito, nos afastamos da nossa própria imagem no espelho da vida.

Desse modo, fujamos dos aconselhamentos dos outros, não deixemos que metam o nariz na nossa existência, pensar exageradamente pode estragar a seiva que gera os sentimentos mais belos. Aquilo que nos torna seres humanos é capacidade que temos de sentir, seja qual forem nossas sensações.
A filosofia existe como saída para a vida das palavras, para o homem se sentir seguro na tentativa de explicar o inexplicável. O que nós precisamos diariamente não é de filosofia, é de poesia, daquela gerada no compartilhamento dos desejos, na realização dos sonhos, no olhar que avista o céu e contempla o azul sem buscar na ciência motivo para o azul.

Não estou tentando racionalizar a vida, palavras são a prova de que a poesia não precisa de idéias, a poesia pulsa principalmente fora das palavras, longe dos dicionários. A própria vida vive sem palavras, as palavras é que anseiam por vida, é a essência do sentir, de todas as sensações do mundo. Cada um de nós é um universo inexplorável, a mente é o único habitante desse território. Todavia, poderia esse animal de grau elevado na escala evolutiva, chamado homem, dar à mente a capacidade de compreender o enigma de todas as galáxias do seu coração? Poderia a razão compreender o mistério das coisas mais simples? Nós é que complicamos tudo quando cismamos de explicar, julgar, supor, avaliar, cientificar a vida.

O Pessoa estava certo "O mundo não se fez para pensarmos nele, mas para olharmos para ele e estarmos de acordo".

Quem sou eu

Sou o que ninguém sabe e o que todo mundo conhece ou cobiça saber. Não me compreendem porque não me entendem. Não me entendem porque não me compreendem. É fácil. Se há certeza, é a duvida de tudo. Se há dúvida, é a certeza apavorante de não saber nada disso, nem daquilo, nem de coisa alguma. Não sou paradoxo, nada de versos sobre minha exatidão, sou imprecisão exata, abstração concreta, sou eu, só eu tão mim-mesmo. Se me queriam outro, por que procuram-me? Procurem outro, ou escavem esse outro em mim, tenho milhares de mins num eu. Ora, sou matéria palpável e dita de um absurdo impalpável e indizível. Só me entende quem não me quer entender. Não sou resposta, já disse, nem tenho respostas, sou a pergunta aberta e fria que nunca cansa de ser dúvida, que não cessa da convicção de não saber quem sou.
"A vida inteira estive em tudo como um deus, eu era todas as coisas de uma só vez, era a prece e a sentença, a entrega e a perdição, as juras e todo o pecado. A vida inteira cabia em mim porque eu era a vida inteira dentro de mim, até perceber que eu faltava a mim... perdi tudo sem nunca ter tido coisa nenhuma".