13 outubro 2007

DES-Ped/aço


caminho pelos espaços vãos
perdi a sorte, perdi a calma, a hora
perdi o bonde, perdi isso...
um corte na testa, outro na alma
isso atesta o coração contrito
isso atesta que a vida é um saco

estou um caco
em atrito com o mundo
estou escasso,
obcecado com tudo

e ainda ressacado e aflito
e com os nervos e a paz
desarticulados

não sou capaz de sustentar
a vida na sua casca

o corpo não é mais feito de aço
o dia despencou,
as contas venceram

a carteira de cigarro amarrotou,
estou duro, sem a metafísica
e sem mulher.
(o pior é estar sem mulher)
qualquer sensação
aparente sustentável humana
me despedaça
o vazio enfarta

me tomaram a carteira
o relógio
caí, pisei no cadarço

estou sozinho demais
para caber na minha solidão,
as roupas amarrotadas no chão
no chão também meus pedaços


a vida surrupiou o tecido dos sonhos
e devastou um coração que era vento
vasto

eu me perdôo pelo que
não fui e não fiz
por fazer o que não faço

porque, em verdade,
eu nunca fui o que sou
eu nunca fico,
eu sempre passo.


Geovane Belo, modificado em 21 de outubro




Quem sou eu

Sou o que ninguém sabe e o que todo mundo conhece ou cobiça saber. Não me compreendem porque não me entendem. Não me entendem porque não me compreendem. É fácil. Se há certeza, é a duvida de tudo. Se há dúvida, é a certeza apavorante de não saber nada disso, nem daquilo, nem de coisa alguma. Não sou paradoxo, nada de versos sobre minha exatidão, sou imprecisão exata, abstração concreta, sou eu, só eu tão mim-mesmo. Se me queriam outro, por que procuram-me? Procurem outro, ou escavem esse outro em mim, tenho milhares de mins num eu. Ora, sou matéria palpável e dita de um absurdo impalpável e indizível. Só me entende quem não me quer entender. Não sou resposta, já disse, nem tenho respostas, sou a pergunta aberta e fria que nunca cansa de ser dúvida, que não cessa da convicção de não saber quem sou.
"A vida inteira estive em tudo como um deus, eu era todas as coisas de uma só vez, era a prece e a sentença, a entrega e a perdição, as juras e todo o pecado. A vida inteira cabia em mim porque eu era a vida inteira dentro de mim, até perceber que eu faltava a mim... perdi tudo sem nunca ter tido coisa nenhuma".