30 setembro 2007


Eu queria ser largo e belo feito o vento


Eu é que passo
E não o tempo.
Sem pele e sem tato

Tento tocar tua pele
com meu tato
intenso.
Tento sem voz e sem pressa
Levar ao teu ouvido
meu som de silêncio puro
e atento.
Tento sem cheiro e sem corpo
Lamber tua carne
impregnar meu cheiro lento
do teu perfume
que exala a doçura da vida
e o alento.
Tento sem pernas e sem pressa
Passar por ti
E te fazer me notar sem me ter
sou o estado sem pessoa
que está contigo
imenso
Eu queria passar, a qualquer hora,
Pelas brechas do teu rosto
que é triste,
e imerso em ti,
ir sem rumo ao teu infinito
caminhar nos descaminhos dos teus pés.
Infiltrar-me
Encarcerar-me
Nos anseios que invento
Com a minha língua seca
delinear tuas formas
Porque eu não sou mais eu,
Sou tu.
Vem, tu,
desenhar em mim o teu feitio,
Eu queria ser feito no teu cabelo
Largo e belo feito o vento.

22 setembro 2007

O amor entrelaça desejos, estreita caminhos, constrói mistérios. Só que, às vezes, retrai, omite, definha a gente que ama. O amor que é ar, também sufoca, dispersa a vida, confunde a cabeça. Ele, que é nosso parceiro, torna-se nosso inimigo, o assassino que nos esgana com as mãos pesadas da solidão. Os caminhos desse sentimento são duas estradas que se cruzam: uma leva à vida, outra, à morte.

16 de setembro de 2007.

Quem sou eu

Sou o que ninguém sabe e o que todo mundo conhece ou cobiça saber. Não me compreendem porque não me entendem. Não me entendem porque não me compreendem. É fácil. Se há certeza, é a duvida de tudo. Se há dúvida, é a certeza apavorante de não saber nada disso, nem daquilo, nem de coisa alguma. Não sou paradoxo, nada de versos sobre minha exatidão, sou imprecisão exata, abstração concreta, sou eu, só eu tão mim-mesmo. Se me queriam outro, por que procuram-me? Procurem outro, ou escavem esse outro em mim, tenho milhares de mins num eu. Ora, sou matéria palpável e dita de um absurdo impalpável e indizível. Só me entende quem não me quer entender. Não sou resposta, já disse, nem tenho respostas, sou a pergunta aberta e fria que nunca cansa de ser dúvida, que não cessa da convicção de não saber quem sou.
"A vida inteira estive em tudo como um deus, eu era todas as coisas de uma só vez, era a prece e a sentença, a entrega e a perdição, as juras e todo o pecado. A vida inteira cabia em mim porque eu era a vida inteira dentro de mim, até perceber que eu faltava a mim... perdi tudo sem nunca ter tido coisa nenhuma".