16 outubro 2005

" Enquanto houver nos lábios de uma mulher o desejo, existirá em qualquer homem a certeza da perdição"


A poesia suja do porão da minha casa

A poesia suja do porão da minha casa
não é um sentimento
e nem podia ser eu, verdade presa.
Se eu pudesse transpor sentimentos,
não faria versos,
faria
sen - ti - men - tos...
(limpos com cheiro de vento).

Meu pedaço de melancolia
ficaria sobre a rotina dos bares.
Eu mesmo,
nenhum outro a não ser eu mesmo
involuntariamente cheio de mim
desperdiçaria madrugadas
e suas horas ridículas
parindo versinhos de lamento.
Ficaria numa cama de pau duro
bolinando uma garota pura
como um pecador


que reza pra não pecar
e peca rezando.

Perdoe-me as palavras.
A poesia suja do porão da minha casa
Não é uma intenção
quem sabe fosse uma prece,

Mas eu não faço sentimentos
eu não sei rezar.

Quem sou eu

Sou o que ninguém sabe e o que todo mundo conhece ou cobiça saber. Não me compreendem porque não me entendem. Não me entendem porque não me compreendem. É fácil. Se há certeza, é a duvida de tudo. Se há dúvida, é a certeza apavorante de não saber nada disso, nem daquilo, nem de coisa alguma. Não sou paradoxo, nada de versos sobre minha exatidão, sou imprecisão exata, abstração concreta, sou eu, só eu tão mim-mesmo. Se me queriam outro, por que procuram-me? Procurem outro, ou escavem esse outro em mim, tenho milhares de mins num eu. Ora, sou matéria palpável e dita de um absurdo impalpável e indizível. Só me entende quem não me quer entender. Não sou resposta, já disse, nem tenho respostas, sou a pergunta aberta e fria que nunca cansa de ser dúvida, que não cessa da convicção de não saber quem sou.
"A vida inteira estive em tudo como um deus, eu era todas as coisas de uma só vez, era a prece e a sentença, a entrega e a perdição, as juras e todo o pecado. A vida inteira cabia em mim porque eu era a vida inteira dentro de mim, até perceber que eu faltava a mim... perdi tudo sem nunca ter tido coisa nenhuma".