13 maio 2008

A greve dos professores

Balas de borracha, bombas de efeito moral, spray de pimenta, armas contra a nossa classe. Agora não somos mais exemplo pra ninguém. Nós, professores do Estado, nos tornamos desordeiros, vândalos. Senhoras e senhores, pais de família, moços recém-formados, cometemos um crime inafiançável: acreditamos na mudança.

Diz a população: 'São infratores, brigões, não têm o direito de fechar duas ruas da Grande Belém, só porque querem um aumento de salário, uns tíquetes-alimentação, só porque querem da governador Ana Júlia aquilo que ela prometeu durante anos.

É verdade, estamos bufando de raiva do governo que ajudamos a eleger. Na época das eleições, vestimos aquela camisa vermelha horrível e saímos implorando votos, e a mudança aconteceu, tiramos do trono os tucanos que só pensavam em asfalto.

Fomos tapeados. O que a Ana fez conosco foi um chute no traseiro, fomos jogados pela janela como a Isabella, traídos pelo nosso irmão, chifrados pela namorada. Mas, pensando bem, somos educadores de meia-tigela, verdadeiros vagabundos mamando nas tetas do governo. A governadora está correta em mandar tropas de choque para trucidar a nossa quimera. Nossos líderes de giz na mão não 'sacam' que nada muda, nunca vai mudar.

Quando o governo diz que não dá pra aumentar o salário, é porque não dá, pô! Não importa se os colégios estão sucateados, os telhados das salas de aula com goteiras. Não. Que os alunos não tenham carteira, não importa se as salas estão superlotadas, que os alunos da zona rural estão impossibilitados de ir à escola por falta de ônibus. Sempre foi assim, por que agora iria mudar? Tolos somos nós, educadores, por pensarmos em mudança; ora, mudança que nada. Além do mais, nossa classe é ingênua, não sabe o que quer. Somos medrosos, covardes, passivos, hipócritas. Hipócritas por grevar sem motivo, por irmos às ruas, por buscarmos os direitos assistidos pela Constituição, por fazermos valer nossa voz rouca, calejada de tantas aulas.

Nossa hipocrisia remonta a desculpa de que estamos preocupados com nossos alunos. Como é que os coitadinhos vão ficar sem aula? Vamos deixar de ensinar o bê-á-bá, as contas de somar? Como saberão que o Tiradentes foi enforcado por lutar - e que ele, sim, pensava em mudança e se deu mal?

Certos são aqueles professores que estão em casa vendo tudo pela tevê, pelo jornal; como é bela a falta de coragem deles. Pobres de espírito se justificam com argumentos do tipo: se for para pagar aula, depois eu não grevo; se descontar falta; eu não vou também, estou para me aposentar, então, eu não vou entrar nessa, estou no estágio probatório, não posso me arriscar; sou contratado; então não vou; eu apóio a greve; sim; só não quero ir, isso não vai dar em nada, então não dá, não vou, não vou...

Quem sabe se nós pensássemos igualmente, se nos juntássemos nessa luta... A gente conseguisse mais, mas não! Quer saber? Vamos esquecer!... Somos incapazes de um consenso, somos diferentes demais, matemáticos, biólogos, geógrafos... Não dá pra misturar nossas mentes em busca de uma causa comum, não vamos nos unir, não! O certo é colocar o nosso rabinho entre as pernas, aceitarmos a merreca de aumento, o miserável auxílio-alimentação - é melhor do que nada.

Para não ficarmos envergonhados perante os alunos, vamos dizer que já foi uma conquista, e que nunca, na história desse Estado, se fez tanto pela educação. As mudanças, a gente consegue de pouquinho, por sinal, bem de pouquinho.

Ah, desculpa! Juro que não é ironia! Nada de choro, os olhos estão vermelhos e ardendo, mas não são lágrimas nem propaganda do PT. Como diz o ditado: 'Pimenta nos olhos dos outros é refresco'.

Geovane Silva Belo e José Alan Pereira de Souza
E-mail: geovanebelo@hotmail.com]

Quem sou eu

Sou o que ninguém sabe e o que todo mundo conhece ou cobiça saber. Não me compreendem porque não me entendem. Não me entendem porque não me compreendem. É fácil. Se há certeza, é a duvida de tudo. Se há dúvida, é a certeza apavorante de não saber nada disso, nem daquilo, nem de coisa alguma. Não sou paradoxo, nada de versos sobre minha exatidão, sou imprecisão exata, abstração concreta, sou eu, só eu tão mim-mesmo. Se me queriam outro, por que procuram-me? Procurem outro, ou escavem esse outro em mim, tenho milhares de mins num eu. Ora, sou matéria palpável e dita de um absurdo impalpável e indizível. Só me entende quem não me quer entender. Não sou resposta, já disse, nem tenho respostas, sou a pergunta aberta e fria que nunca cansa de ser dúvida, que não cessa da convicção de não saber quem sou.
"A vida inteira estive em tudo como um deus, eu era todas as coisas de uma só vez, era a prece e a sentença, a entrega e a perdição, as juras e todo o pecado. A vida inteira cabia em mim porque eu era a vida inteira dentro de mim, até perceber que eu faltava a mim... perdi tudo sem nunca ter tido coisa nenhuma".