01 julho 2008


Desculpa poética

Desculpe! Não consigo compor esse poema!
me rasgaram os lábios
que eram limpos e poéticos
tenho agora os olhos secos e bem fora da boca
tenho a vista e cabeça perdidas no chão.
Desculpe! Não consigo compor esse poema
a ferida na boca é esse não conseguir compor,
é ter o engano na mão no lugar de versos
e considerar-me louco e absurdo
por não ter flores na língua,
por ter apenas o vazio na boca.
nunca pensei não conseguir compor um poema,
e estou como um cadáver
com os olhos atentos vendo minha boca chagada
vendo meu crânio envolto em panos
debatendo-se na ausência desse poema.

- Pausa
(o poeta imóvel, de repente, chorou em seco)

Desculpe,
eu compus um poema!

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Quem sou eu

Sou o que ninguém sabe e o que todo mundo conhece ou cobiça saber. Não me compreendem porque não me entendem. Não me entendem porque não me compreendem. É fácil. Se há certeza, é a duvida de tudo. Se há dúvida, é a certeza apavorante de não saber nada disso, nem daquilo, nem de coisa alguma. Não sou paradoxo, nada de versos sobre minha exatidão, sou imprecisão exata, abstração concreta, sou eu, só eu tão mim-mesmo. Se me queriam outro, por que procuram-me? Procurem outro, ou escavem esse outro em mim, tenho milhares de mins num eu. Ora, sou matéria palpável e dita de um absurdo impalpável e indizível. Só me entende quem não me quer entender. Não sou resposta, já disse, nem tenho respostas, sou a pergunta aberta e fria que nunca cansa de ser dúvida, que não cessa da convicção de não saber quem sou.
"A vida inteira estive em tudo como um deus, eu era todas as coisas de uma só vez, era a prece e a sentença, a entrega e a perdição, as juras e todo o pecado. A vida inteira cabia em mim porque eu era a vida inteira dentro de mim, até perceber que eu faltava a mim... perdi tudo sem nunca ter tido coisa nenhuma".